" Este mi amo por mil señales he visto que es un loco de atar, y aun también yo no le quedo en zaga, pues soy más mentecato que él, pues le sigo y le sirvo, si es verdadero el refrán que dice: "Dime con quién andas , decirte he quién eres", y el otro de "Non con quien naces sino cn quien paces."
(Dom Quixote de La Mancha - Parte 2 - Capítulo X - Miguel de Cervantes)
O PT, Partido dos Trabalhadores, completa hoje 36 anos. Propositalmente escolho "completa" e não "comemora", pois, mergulhado em crises sequenciais e gravíssimas, não vejo o que há para comemorar. A não ser a simples existência e resistência, seja lá como for.
Apesar de assumida e reativa opositora , não é sem algo de melancolia e decepção que escrevo sobre essa data. Acreditem os simpatizantes: para a grande maioria da "oposição", não há sentimentos de vitória ou satisfação ou vingança. Há, no fundo, tristeza ressentida por se ter ido tão longe e apostado tão alto para chegar ao beco sem saída. E sem saída para todos: para os que seguem confiantes, para os que recuaram ao longo do caminho e para os que jamais arriscaram.
Encaixo-me no segundo grupo. Filiei-me ao PT na sua formação, garantindo o número de assinaturas necessárias. Votei - e ainda hoje sem qualquer arrependimento! - na Luiza Erundina para prefeita de São Paulo em 1988. Cantei Lulla Lá em altos brados contra o Collor em 1989. Votei em Eduardo Suplicy - por muito tempo o meu senador - vezes sem conta.
Para a minha geração, que foi às ruas pela Diretas Já e que testemunhou a transição da ditadura para a democracia, o projeto PT era promissor e sedutor. Tenho memórias da ditadura. Estudei num colégio notadamente subversivo (CAp da UFRJ) e vários de nossos professores foram presos e torturados. Alguns dos alunos mais velhos, da geração da minha irmã mais velha, desapareceram. Os relatos eram contados em minúcias. Lembro sempre do nosso professor de História, já no 2º grau, contando sobre o carro preto parado na porta da escola esperando a filha do General Geisel, que também estudou lá, e as mensagens de aprovação ou condenação que recebia sobre os apontamentos de aula que eram lidos com atenção. A oportunidade real de praticar política sob outros valores e outras formas de liberdade e igualdade , portanto, era mais do que bem vinda!
Infelizmente, o meu ceticismo veio rápido e minha simpatia não chegou nem mesmo ao final do primeiro mandato do Lula! E passei, sem remorsos e sem dúvidas, mas ao mesmo sem orgulho, a antipatizante convicta.
Discordo dos meios escusos que jamais justificam os fins. Discordo, aliás, dos fins! Os fins que se distanciaram/distanciam cada vez mais das palavras que os definiam/definem. Discordo até mesmo de esvaziarem conteúdos de palavras par esconder reais finalidades. Mas, afinal, esse é o cruel destino das palavras: serem usadas ao bel prazer dos outros.
Discordo do equívoco de que as políticas frágeis e sem sustentação promoveram a tão aclamada - mais do que necessária - revolução social no Brasil! Promoveu-se, sim, a ilusão de que a miséria pode ser erradicada independente da produção. A mais cruel e destrutiva injustiça social é a combinação desemprego e inflação. Não se promove transformação social sem esse equilíbrio.
Discordo da rede criminosa de complexidades que impressionam. E, claro, revoltam! Discordo da defesa pífia de que práticas corruptas e herdadas da nossa lamentável tradição política justificam a corrupção desta magnitude. Não justificam. E apenas confirmam que o verdadeiro projeto é a manutenção do poder pelo poder. E que se permita usar a miséria e a ignorância como aliados e parceiros desse poder.
Discordo dos que, mesmo diante das evidências e provas irrefutáveis, defendam o indefensável. Discordo que vilões se transformem em heróis. Discordo das blindagens disseminantes de mentiras e artimanhas. Discordo do discurso do nada sei. Discordo da arrogância teimosa de quem se vê acima da lei e das humanidades. Discordo da lealdade cega - ou pior, da lealdade comprometida - que encontra absolvição nas tecnicidades jurídicas.
Discordo das alianças impensáveis com quem, mais dia menos dia, vem cobrar as almas vendidas. Discordo dos que, mesmo contrários - na retórica vazia - às práticas escusas, mantêm-se solidários e co-partidários. Discordo dos oportunistas.
E discordo dos escolhas econômicas que criam - apenas criam - a ilusão da inclusão social. Tão urgente e necessária.
Peço licença ao Mestre Cervantes para apropriar-me da sua Triste Figura para ilustrar as Tristes Figuras em que os fundadores e/ou lideranças e/u sócios do PT se transformaram. Tristes Figuras associadas a escândalos que se desfiam em emaranhados de proporções ainda desconhecidas. Tristes Figuras que, atônitas, se recusam a descobrir sua nudez. Tristes Figuras que acreditam que suas histórias - em algum momento louvável - lhes garantem impunidade e lhe perdoam qualquer transgressão. Tristes Figuras que se rodeiam de interesses e condutas questionáveis, mas que não admitem fazer parte. Tristes Figuras que perderam qualquer credibilidade, mas insistem na divindade salvadora que criaram. Tristes Figuras que se perderam em si mesmos e de si mesmos.
Peço, ao mesmo tempo, desculpas ao Mestre Cervantes pela comparação. O Cavaleiro da Triste Figura da ficção tem mesmo nobres motivações e conduta! Expõe-se pelos seus devaneios e delírios. Vê gigantes em moinhos sem jamais abandonar suas crenças. Segue incansável e obstinado na sua missão.
As Tristes Figuras do PT, pelo seu lado, vivem seus delírios e devaneios cada vez mais distanciados dos ideais de nobreza que regem as grandes missões cavaleiras.
Incapazes de assumir seus erros, limitações e inabilidades, resta às Tristes Figuras fazer aquilo que , SIM, fazem bem:
(1) atribuir seus próprios erros, incapacidades e fracassos à Grande Teoria da Conspiração e Perseguição No quarto mandato consecutivo na condução do país, defender essa teoria é, no mínimo, patético.
E, simultaneamente,
(2) transferir culpas e responsabilidades na confortável posição de oposição. Na falta de culpados fora do seu próprio ninho e berço , já protagonizam a oposição reflexiva, tornando-se oposição nada velada dos seus próprios governos.
Que na reflexão dos seus 36 anos, o PT consiga encontrar respostas e resgatar alguma nobreza intocada. E que dessa semente brote algo de bom, frutífero e produtivo.
Que na reflexão dos 36 anos do PT, nós também, lutemos por uma politica mais nobre, mais inclusiva, mais engrandecedora, mais justa, menos corrompida. Que certamente não está visível por ai, em nenhuma dessas lideranças atuais. Mas que pode surgir de novos alinhamentos, novas convicções, novos comprometimentos!
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