"A vida é uma comédia escrita por um comediante sádico." (Café Society)
Há algo de extremamente confortador em recostar-se na poltrona do cinema e ouvir o familiar som de jazz na introdução sem malabarismos visuais de um filme de Woody Allen.
É ainda mais confortador ouvir a sua inconfundível voz narradora ao fundo, com a entonação típica dos grandes contadores de histórias, enquanto romances e comédias e tragédias e sátiras e críticas costuram um enredo improvável.
Café Society reúne de forma harmônica o que há de mais característico na extensa obra do diretor ainda tão produtivo aos 80 anos: amor pelo cinema, amor pelo amor, crítica social ácida, herança judaica e angústias existenciais.
A ambientação no glamour dos anos 30 é perfeita para homenagear a época de ouro de Hollywood! E não faltam referências como Barbara Stanwick, Gloria Swanson, Um Lugar ao Sol, Casablanca, para citar apenas algumas. Figurino e cenários que encantam e primam pela estética cuidadosa e elegante!
O romance é a linha condutora do filme, através do triângulo amoroso que alterna as ilusões e desilusões do amor. Escolhas. Boas e más. E como essas mesmas ilusões e desilusões sustentam as consequências dessas boas ou más escolhas.
As críticas sociais, cínicas e ácidas, denunciam, no melhor estilo F.Scott Fitzgerald em The Great Gatsby, o vazio e superficialidade da sociedade que vive de aparências. Há muito de Gatsby em Café Society! Principalmente a forte impulsão solar!
A herança judaica responde pela comicidade do filme! A disfuncional família judia de Nova York e pontuada de caricaturas e exageros. As passagens são hilárias e plenamente reconhecíveis! Pérolas de mães judias, como a máxima: "Viva cada momento como se fosse o último, porque um dia será."
As angústias existenciais são diluídas nos personagens secundários que complementam, brilhantemente, os personagens principais.
O ingênuo e sonhador Bobby Dorfman é uma das melhores personas de Woddy Allen, com sua aparência e comportamento contidos e oratória longa e elaborada. Jesse Eisenberg convence e sustenta.
Vonnie, interpretada por Kristen Stewart, é pura luz! Sua primeira aparição lembra a cena inicial de Daisy em The Great Gatsby: uma aurea de sol que ofusca! Kristen está líndíssima e confere à Vonnie mais estética do que conteúdo. A interpretação não impressiona, mas não compromete.
Steve Carell como Phil está absolutamente perfeito! Que sorte a substituição de Bruce Willis! Phil tem dramaticidade, coerência e convencimento!
A bela Blake Lively como Veronica tem pequena participação, mas ilumina por sua beleza e doçura!
Mas os maiores méritos do filme são a sua impecável trilha sonora e a maestria da fotografia de Vittorio Storaro! Ao som de "That Lady is a Tramp", "Manhattan", "My Romance", "I Only Have Eyes for You", "This Can't Be Love", as cores quentes de Hollywood e as sombrias de Nova York compõem nuances e crepúsculos absolutamente espetaculares! Um das cenas mais lindas do filme , o jantar romântico de Bobby e Vonnie, é distorcida por velas e sombras. O efeito é incrível!
Café Society ilumina a comicidade sádica da vida em nuances sutis das memórias de ilusões e desilusões.
Ali ali só ali se se alice ali se visse quanto alice viu e não disse se ali ali se dissesse quanta palavra veio e não desce ali bem ali dentro da alice só alice com alice ali se parece (Paulo Leminski)
domingo, 28 de agosto de 2016
sexta-feira, 19 de agosto de 2016
Dindastia.
dindastia: s.f. 1. processo de sucessão de madrinhas dentro de uma mesma família 2. sequência hierárquica (hereditária ou não) de madrinhas que estabelecem linhagens reais dentro da mesma função.
A minha dindastia, a mais real das reais, criou-se a partir de 19 de agosto de 1976, com o nascimento da Flavia, minha primeira afilhada. Nasceu linda e iluminada!
Aprendi a fazer tricô só pra fazer, eu mesma, o presente especial do seu primeiro aniversário. Fiz um colete horroroso, num degradê horroroso de marrons e caramelos que minha irmã, bravamente, chegou a usar. Muita sorte ser calor no Rio de Janeiro e bebês perderem a roupa muito rapidamente!
A minha afilhada cresceu mais linda e mais iluminada! São muitas as memórias ... Falava só por sílabas tônicas. Isso incluía o seu próprio nome, que de Flavinha passou a Vim. Meu pai a chamava de trem doido. E nós, de Flavinha-Quero-Quero. Sua irmã mais velha ganhou de presente a boneca "Bebê Coração" que ela tanto queria, e ela, inconformada, repetia sem parar "bebê ção é minha!". Virou sua marca registrada.
A minha afilhada foi crescendo ainda mais linda e mais iluminada! Até que, não sabemos bem ao certo quando, ela instituiu o tal caderninho preto.Caderninho temido! Ser incluído naquelas páginas era o pior dos pesadelos de toda a família! Os critérios não eram muito claros e ao menor deslize... Pá! Nome no caderno! E pra sair do caderninho? Muitos tentaram, mas não se sabe ao certo se tiveram sucesso. Uso os verbos no passado porque ela jura de pé junto que aposentou o famigerado. Mas os traumas ainda não foram superados.
A minha afilhada continuou crescendo. Linda e Iluminada. Há 18 anos, resolveu me tornar tia-avó. Seria até desaforo, não fosse o Mateus (loiro de deixar qualquer norueguês encabulado), logo seguido pelo Tiago, esses meninos lindos que inauguraram em altíssimo estilo a terceira geração da família!
A minha afilhada tornou-se uma mulher realmente linda e iluminada! Sensível, preocupada, amorosa, atenciosa, presente, solidária. Companheira pra qualquer programa! De shopping a Rock in Rio! Parceirona de projetos! E tão talentosa... Faz scrap como ninguém, bonecas de pano como as de antigamente, borda com perfeição e é a melhor maquiadora do mundo! Além do inconfundível "É meiiixmo, Ticinha?" que eu adoro ouvir!
Dizem que as dindastias são formadas a partir das características que afilhadas herdam de suas madrinhas. Deve ser mesmo verdade, porque dividimos, entre outras coisas, a falta de lábio superior, os vômitos e enjoos emocionais, o forte apego familiar, a curiosidade insaciável e o choro fácil.
Mas a recíproca deveria ser verdadeira e madrinhas deveriam adquirir também características de suas afilhadas. Dela, queria um pouquinho só da beleza, um respingo do talento e a raspa da doçura tão cativante. Seria a mais feliz das madrinhas!
É bem verdade que, numa hierarquia invertida, ela ser princesa fez de mim rainha! E só assim consigo conhecer, ainda que tangencialmente, toda a grandeza dessa realeza criada a partir dela! E com a certeza que todas as suas qualidades serão passadas para a próxima da nossa linhagem sucessória! A afilhada da minha filhada, Laura, com apenas 5 aninhos, já é princesinha das sapatilhas à coroa!
Minha dindastia hoje completa 40 anos! Quatro décadas de amor imensurável e de orgulho que não cabem dentro de mim!
Hoje tem festa na corte! LONG LIVE MY PRINCESS!!
A minha dindastia, a mais real das reais, criou-se a partir de 19 de agosto de 1976, com o nascimento da Flavia, minha primeira afilhada. Nasceu linda e iluminada!
Aprendi a fazer tricô só pra fazer, eu mesma, o presente especial do seu primeiro aniversário. Fiz um colete horroroso, num degradê horroroso de marrons e caramelos que minha irmã, bravamente, chegou a usar. Muita sorte ser calor no Rio de Janeiro e bebês perderem a roupa muito rapidamente!
A minha afilhada cresceu mais linda e mais iluminada! São muitas as memórias ... Falava só por sílabas tônicas. Isso incluía o seu próprio nome, que de Flavinha passou a Vim. Meu pai a chamava de trem doido. E nós, de Flavinha-Quero-Quero. Sua irmã mais velha ganhou de presente a boneca "Bebê Coração" que ela tanto queria, e ela, inconformada, repetia sem parar "bebê ção é minha!". Virou sua marca registrada.
A minha afilhada foi crescendo ainda mais linda e mais iluminada! Até que, não sabemos bem ao certo quando, ela instituiu o tal caderninho preto.Caderninho temido! Ser incluído naquelas páginas era o pior dos pesadelos de toda a família! Os critérios não eram muito claros e ao menor deslize... Pá! Nome no caderno! E pra sair do caderninho? Muitos tentaram, mas não se sabe ao certo se tiveram sucesso. Uso os verbos no passado porque ela jura de pé junto que aposentou o famigerado. Mas os traumas ainda não foram superados.
A minha afilhada continuou crescendo. Linda e Iluminada. Há 18 anos, resolveu me tornar tia-avó. Seria até desaforo, não fosse o Mateus (loiro de deixar qualquer norueguês encabulado), logo seguido pelo Tiago, esses meninos lindos que inauguraram em altíssimo estilo a terceira geração da família!
A minha afilhada tornou-se uma mulher realmente linda e iluminada! Sensível, preocupada, amorosa, atenciosa, presente, solidária. Companheira pra qualquer programa! De shopping a Rock in Rio! Parceirona de projetos! E tão talentosa... Faz scrap como ninguém, bonecas de pano como as de antigamente, borda com perfeição e é a melhor maquiadora do mundo! Além do inconfundível "É meiiixmo, Ticinha?" que eu adoro ouvir!
Dizem que as dindastias são formadas a partir das características que afilhadas herdam de suas madrinhas. Deve ser mesmo verdade, porque dividimos, entre outras coisas, a falta de lábio superior, os vômitos e enjoos emocionais, o forte apego familiar, a curiosidade insaciável e o choro fácil.
Mas a recíproca deveria ser verdadeira e madrinhas deveriam adquirir também características de suas afilhadas. Dela, queria um pouquinho só da beleza, um respingo do talento e a raspa da doçura tão cativante. Seria a mais feliz das madrinhas!
É bem verdade que, numa hierarquia invertida, ela ser princesa fez de mim rainha! E só assim consigo conhecer, ainda que tangencialmente, toda a grandeza dessa realeza criada a partir dela! E com a certeza que todas as suas qualidades serão passadas para a próxima da nossa linhagem sucessória! A afilhada da minha filhada, Laura, com apenas 5 aninhos, já é princesinha das sapatilhas à coroa!
Minha dindastia hoje completa 40 anos! Quatro décadas de amor imensurável e de orgulho que não cabem dentro de mim!
Hoje tem festa na corte! LONG LIVE MY PRINCESS!!
domingo, 14 de agosto de 2016
Porque mãe é tudo igual. Mas cada pai é único.
O meu pai:
- Chamava-se Edgard e era o terceiro entre os dez filhos de Alberto e Ottilia.
- Nasceu no Rio de Janeiro em 1922 e morreu em São Paulo em 1983.
- Veio de uma família onde irmão cuida de irmão, sobrinho de tio, tio de sobrinho, primo de primo, todos um pouco de cada e cada um pouco de todos. Todos juntos e todos misturados. E assim nos ensinou a viver em famílias.
- Era engenheiro agrônomo formado no km 47 (UFRRJ) e sempre acreditou no estudo como a única forma de se construir a vida. Crescemos num ambiente onde estudar sempre foi prioridade.
- Também insistia na nossa realização profissional e independência financeira. Começamos a trabalhar muito cedo, sempre com o seu incentivo e apoio.
- Jogou basquete quando jovem e foi até técnico.
- Jogou vôlei de praia até quase o fim da vida. Praia do Leme, todos os domingos. Após as partidas, o tradicional chopp na Taberna Atlântica. Uma verdadeira religião. E de tal devoção, que a a Taberna Atlântica, em reconhecimento por décadas de fidelidade, numa cerimônia festiva e inesquecível, inaugurou uma placa comemorativa na mesa onde sempre se sentavam: Veteranos do Vôlei.
- Acreditava na amizade e manteve os seus amigos por toda a vida. Praticava verdadeiramente a amizade. Crescemos em casas cheias e convivemos com todos esses amigos - de diversas nacionalidades, religiões, origens e idades - a quem chamávamos/chamamos de tios. E essas amizades passaram gerações e herdamos esses "primos" de vida. Laços estreitos. Laços eternos.
- Só conheceu cinco dos onze netos. Babava pela Marcela, chamava a Flavia de "trem doido", provocava a Adriana com "quase 8:00", levava o Dudu ao Ibirapuera até a exaustão e mal podia esperar o Xande "ficar de pé".
- Chamava minha mãe de Rosinha.
- Dizia que a Andréa, a minha irmã caçula, era a combinação perfeita entre ele e minha mãe.
- Desenhava nossas bonecas de papel quando éramos pequenas.
- Nos levava para conhecer Brasilia quando completávamos 10 anos.
- No mandava pro programa de intercâmbio nos EUA quando completávamos 15 anos.
- Só nos deixava fumar em casa depois dos 18 anos.
- Levava e nos buscava nos bailes de carnaval.
- Confundia as minhas fotos com as da minha mãe quando jovem.
- Implicava com todos os namorados e amigos cabeludos.
- Não gostava de barba e bigode.
- Dizia que hóspede é que nem peixe: depois de 3 dias começa a feder.
- Jogava buraco e adorava provocar a dupla adversária. E não cansava de repetir que "o major dizia que não se dá carta do meio".
- Dormia depois do almoço todo sábado e domingo.
- Não acertava o tamanho das roupas que nos trazia de suas viagens. Mas nos trazia Barbies.
- Era magérrimo quando jovem. Mas engordou, engordou, engordou.
- Era mais severo que o Detran! Quando tirávamos a nossa carteira de motorista, tínhamos que passar pela sua prova pessoal: um dia de sol, um dia de chuva e uma noite.
- Era muito alegre e adorava festas. Gostava de comer. Muito. Gostava de beber. Muito.
- Fumava charuto depois do almoço aos domingos.
- Era muito respeitado e querido profissionalmente. E mais ainda pessoalmente.
- Tinha um senso de humor fantástico! Sempre com muito deboche e ironia.
- Mas quando bravo...
- Era justo. E moderno pra muitas coisas.
- Tinha muito orgulho da família que construiu com a minha mãe.
- Nos deixou cedo demais.
- Chamava-se Edgard e era o terceiro entre os dez filhos de Alberto e Ottilia.
- Nasceu no Rio de Janeiro em 1922 e morreu em São Paulo em 1983.
- Veio de uma família onde irmão cuida de irmão, sobrinho de tio, tio de sobrinho, primo de primo, todos um pouco de cada e cada um pouco de todos. Todos juntos e todos misturados. E assim nos ensinou a viver em famílias.
- Era engenheiro agrônomo formado no km 47 (UFRRJ) e sempre acreditou no estudo como a única forma de se construir a vida. Crescemos num ambiente onde estudar sempre foi prioridade.
- Também insistia na nossa realização profissional e independência financeira. Começamos a trabalhar muito cedo, sempre com o seu incentivo e apoio.
- Jogou basquete quando jovem e foi até técnico.
- Jogou vôlei de praia até quase o fim da vida. Praia do Leme, todos os domingos. Após as partidas, o tradicional chopp na Taberna Atlântica. Uma verdadeira religião. E de tal devoção, que a a Taberna Atlântica, em reconhecimento por décadas de fidelidade, numa cerimônia festiva e inesquecível, inaugurou uma placa comemorativa na mesa onde sempre se sentavam: Veteranos do Vôlei.
- Acreditava na amizade e manteve os seus amigos por toda a vida. Praticava verdadeiramente a amizade. Crescemos em casas cheias e convivemos com todos esses amigos - de diversas nacionalidades, religiões, origens e idades - a quem chamávamos/chamamos de tios. E essas amizades passaram gerações e herdamos esses "primos" de vida. Laços estreitos. Laços eternos.
- Só conheceu cinco dos onze netos. Babava pela Marcela, chamava a Flavia de "trem doido", provocava a Adriana com "quase 8:00", levava o Dudu ao Ibirapuera até a exaustão e mal podia esperar o Xande "ficar de pé".
- Chamava minha mãe de Rosinha.
- Dizia que a Andréa, a minha irmã caçula, era a combinação perfeita entre ele e minha mãe.
- Desenhava nossas bonecas de papel quando éramos pequenas.
- Nos levava para conhecer Brasilia quando completávamos 10 anos.
- No mandava pro programa de intercâmbio nos EUA quando completávamos 15 anos.
- Só nos deixava fumar em casa depois dos 18 anos.
- Levava e nos buscava nos bailes de carnaval.
- Confundia as minhas fotos com as da minha mãe quando jovem.
- Implicava com todos os namorados e amigos cabeludos.
- Não gostava de barba e bigode.
- Dizia que hóspede é que nem peixe: depois de 3 dias começa a feder.
- Jogava buraco e adorava provocar a dupla adversária. E não cansava de repetir que "o major dizia que não se dá carta do meio".
- Dormia depois do almoço todo sábado e domingo.
- Não acertava o tamanho das roupas que nos trazia de suas viagens. Mas nos trazia Barbies.
- Era magérrimo quando jovem. Mas engordou, engordou, engordou.
- Era mais severo que o Detran! Quando tirávamos a nossa carteira de motorista, tínhamos que passar pela sua prova pessoal: um dia de sol, um dia de chuva e uma noite.
- Era muito alegre e adorava festas. Gostava de comer. Muito. Gostava de beber. Muito.
- Fumava charuto depois do almoço aos domingos.
- Era muito respeitado e querido profissionalmente. E mais ainda pessoalmente.
- Tinha um senso de humor fantástico! Sempre com muito deboche e ironia.
- Mas quando bravo...
- Era justo. E moderno pra muitas coisas.
- Tinha muito orgulho da família que construiu com a minha mãe.
- Nos deixou cedo demais.
segunda-feira, 8 de agosto de 2016
Sobre a grandeza no esporte.
Para ser grande, sê inteiro: nada
Teu exagera ou exclui.
Sê todo em cada coisa. Põe quanto és
No mínimo que fazes.
Assim em cada lago a lua toda
Brilha, porque alta vive.
(Ricardo Reis - 1933)
Ricardo Reis, um dos heterônimos de Fernando Pessoa, escreveu o poema acima em 1933. Entre tantos e tantos e mais tantos e outros tantos poemas absolutamente geniais de FP, escolhi esse como o meu preferido. Desde a primeira vez que o li. Leio, releio, me encanto. Repetidas vezes. Nunca o esgoto. Nunca chego perto do seu sentido final, revelado, decifrado. E surpreendo-me com a abrangência densa e profunda que apenas seis versos provocam.
Ontem, ao acompanhar as várias competições do segundo dia da Rio 2016, e em particular o pífio desempenho da seleção masculina de futebol, esse poema me veio imediatamente à cabeça. Assim como me veio o conceito de grandeza no esporte.
A história está repleta de bons atletas que nos têm presentado com momentos e emoções inesquecíveis com suas conquistas e feitos quase inacreditáveis!
Mas há uma diferença brutal entre ser bom - ou até ótimo - e ser grande. Porque ser grande é atitude, determinação e apreciação que independem de resultados refletidos em medalhas ou títulos.Ser grande é natural, vem de dentro, é espontâneo. Existe em estado bruto e latente, podendo ser lapidado à quase perfeição, mas jamais forjado na sua ausência.
E o ser grande é o que verdadeiramente emociona e impulsiona. A paixão que o esporte provoca só frutifica pela grandeza compreendida e espelhada. Só a grandeza ecoa. Só a grandeza transforma.
Os exemplos são inúmeros! E cada um de nós tem o seu próprio repertório. Ontem mesmo, entre tantas disputas duras, cito a derrota do tenista Novak Djokovic - primeiro no ranking mundial e favorito ao ouro olímpico - diante do argentino Del Potro logo na primeira rodada. No choro incontido e decepcionado, o agradecimento à torcida, o abraço reconhecido no oponente e a certeza de ter feito o seu melhor. Ainda que o seu melhor não tenha sido suficiente. Isso é grandeza.
Em contrapartida, nosso time de futebol masculino em outro baixíssimo desempenho, apático e entregue, com ares de superioridade enfrentada, recolheu-se na sua arrogância intocável, demonstrando despreparo, imaturidade, desrespeito e soberba. Valores contrários e estranhos à grandeza. Desvalores da pequeneza anti-esportiva. A questão não é ganhar, perder ou empatar. A questão é a atitude diante de cada uma das condições. A questão é fazer o melhor possível e prestar contas desse melhor com tranquilidade e humildade. Triste ver o que já foi nosso orgulho nacional se afastar, em passadas largas, desse ideal nobre e exemplar e se ancorar na marra enfrentadora.
Volto a Ricardo Reis. E à sua descrição tão precisa de grandeza e do que efetivamente reflete brilhos de luas!
Teu exagera ou exclui.
Sê todo em cada coisa. Põe quanto és
No mínimo que fazes.
Assim em cada lago a lua toda
Brilha, porque alta vive.
(Ricardo Reis - 1933)
Ricardo Reis, um dos heterônimos de Fernando Pessoa, escreveu o poema acima em 1933. Entre tantos e tantos e mais tantos e outros tantos poemas absolutamente geniais de FP, escolhi esse como o meu preferido. Desde a primeira vez que o li. Leio, releio, me encanto. Repetidas vezes. Nunca o esgoto. Nunca chego perto do seu sentido final, revelado, decifrado. E surpreendo-me com a abrangência densa e profunda que apenas seis versos provocam.
Ontem, ao acompanhar as várias competições do segundo dia da Rio 2016, e em particular o pífio desempenho da seleção masculina de futebol, esse poema me veio imediatamente à cabeça. Assim como me veio o conceito de grandeza no esporte.
A história está repleta de bons atletas que nos têm presentado com momentos e emoções inesquecíveis com suas conquistas e feitos quase inacreditáveis!
Mas há uma diferença brutal entre ser bom - ou até ótimo - e ser grande. Porque ser grande é atitude, determinação e apreciação que independem de resultados refletidos em medalhas ou títulos.Ser grande é natural, vem de dentro, é espontâneo. Existe em estado bruto e latente, podendo ser lapidado à quase perfeição, mas jamais forjado na sua ausência.
E o ser grande é o que verdadeiramente emociona e impulsiona. A paixão que o esporte provoca só frutifica pela grandeza compreendida e espelhada. Só a grandeza ecoa. Só a grandeza transforma.
Os exemplos são inúmeros! E cada um de nós tem o seu próprio repertório. Ontem mesmo, entre tantas disputas duras, cito a derrota do tenista Novak Djokovic - primeiro no ranking mundial e favorito ao ouro olímpico - diante do argentino Del Potro logo na primeira rodada. No choro incontido e decepcionado, o agradecimento à torcida, o abraço reconhecido no oponente e a certeza de ter feito o seu melhor. Ainda que o seu melhor não tenha sido suficiente. Isso é grandeza.
Em contrapartida, nosso time de futebol masculino em outro baixíssimo desempenho, apático e entregue, com ares de superioridade enfrentada, recolheu-se na sua arrogância intocável, demonstrando despreparo, imaturidade, desrespeito e soberba. Valores contrários e estranhos à grandeza. Desvalores da pequeneza anti-esportiva. A questão não é ganhar, perder ou empatar. A questão é a atitude diante de cada uma das condições. A questão é fazer o melhor possível e prestar contas desse melhor com tranquilidade e humildade. Triste ver o que já foi nosso orgulho nacional se afastar, em passadas largas, desse ideal nobre e exemplar e se ancorar na marra enfrentadora.
Volto a Ricardo Reis. E à sua descrição tão precisa de grandeza e do que efetivamente reflete brilhos de luas!
sábado, 6 de agosto de 2016
Foi bonita a festa, pá! Fiquei contente!
"Isso aqui iôiô...É um pouquinho de Brasil iáiá... Desse Brasil que canta e é feliz, feliz... É também um pouco de uma raça... Que não tem medo de fumaça ai ai... E não se entrega não!" (Sandália de Prata - Ary Barroso)
Nosso Brasil plural, diverso, desigual. Nosso Brasil de fortes contrastes geográficos, étnicos, culturais e sociais. Nossos vários Brasis - em multiplicações incansáveis e impensáveis - que ainda aprendem a se conhecer e conviver. Mas que se reconhecem e se unem num gigantesco fio invisível que alterna ódios e amores, orgulhos e vergonhas, desalentos e esperanças. E esse fio, quando esticado até a sua tensão máxima, quase sempre, como mágica, enrosca-nos em novelos macios e aconchegantes e nos desfia, sem pudor, em surpreendentes e infindáveis sentimentos de emoções incontidas e alegrias incontroláveis! E é essa brasilidade aflorada - espontânea e contagiante - que sempre revela o nosso melhor!
E o nosso melhor mostrou-se ontem - muito menos para o mundo e muito mais para nós mesmos. Os nossos espelhos reluziram nossas imagens difusas e confusas, em identidades negadas, renegadas, contestadas e ressentidas. Resgatadas. Recompostas. Rendidas. E em altivez majestosa.
Majestade garantida pelo andar majestoso de Gisele na mais icônica passarela do mundo! Que me perdoem todas as demais passarelas e que me perdoem todas as demais rainhas. Mas depois da noite de ontem, só há uma passarela possível e só há uma rainha coroada. Maracanã e Gisele. Gisele no Maracanã.
Sem suntuosidade, mas com muita criatividade e originalidade , contamos quem somos e porque somos. Nossas misturas e nossas incoerências explicam-se na nossa história narrada sem romantismo, mas também sem condenação. Nossas composições, nossas apropriações e nossas dívidas estavam todas lá. Sem exageros e sem poupanças. E em extrema elegância.
Nossas expressões culturais tão variadas também tiveram o seu espaço justo e merecido. Entre tantas, destacou-se a nossa música, bálsamo pros ouvidos e pros corações. Tom, Chico, meu Chico, Caetano, Gil, Jorge Ben Jor, Elza Soares - diva!, Zeca Pagodinho, Marcelo D2, Ludmilla, Marcos Valle e , sim, Anitta. Porque somos todos esses ritmos. E somos todos esses ritmos com competência e excelência. Do Hino Nacional intimista combinando o samba e o clássico - uma das versões mais emocionantes de todas as versões! - às baterias ritmadas das escolas de samba , e até ao inesperado Gil/Caetano/Anitta.
E talvez "inesperação" seja a palavra que define a Rio 2016! De tudo o que se pudesse esperar, brilhou o inesperado! O que não faz sentido. O inexplicável. O inovador.
Inesperamos como palco para a diversidade. Para o encontro dos diferentes. Para a voz dos poucos ouvidos. Para a inclusão dos excluídos. Crianças com necessidades especiais, Lea T, delegação de refugiados.
Inesperamos com o símbolo da paz adaptado, com os anéis olímpicos absurdamente criativos, com a exuberância da natureza que precisa de tanto cuidado.
Inesperamos com a pira radiosa e com - pela primeira vez em toda a história das Olimpíadas - uma segunda pira "para o povo"!
Inesperamos com a descontração informal e transgressora! E tão apaixonada! E tão cativante!
Inesperamos com o calor, com o brilho, com as luzes, com as cores, com os sons, com as danças, com a grandiosidade luminosa que não coube dentro do Maracanã!
Inesperamos com o reconhecimento de que o verdadeiro atleta não é apenas o que acumula vitórias, mas sim o que pratica grandezas. Esse reconhecimento se fez presente nas merecidas homenagens aos atletas que escrevem a nossa história esportiva dentro desse valor. Salve Vanderlei!
Inesperamos porque realmente nos surpreendemos com a nossa capacidade realizadora! Nosso orgulho confinado escapou descontrolado e permitiu-se vibrar e sonhar!
Inesperamos porque nos vimos! E o que vimos foi o enorme potencial para revertermos a nossa precária condição e condenação.
No sol olímpico que acendeu a nossa chama, uma nova esperança arde recuperada e orgulhosa. E com a certeza de que somos mais, muito mais e maiores do que a pequeneza a que tentam nos reduzir. Pequeneza que, equivocadamente, assumimos como nossa. Mas que , definitivamente, não faz parte de nós.
De tantas imagens que, sei, serão inesquecíveis, escolho cinco. Cinco imagens que talvez apontem novos caminhos para nosso futuro mais justo, inclusivo, respeitoso e conciliador.
Nosso Brasil plural, diverso, desigual. Nosso Brasil de fortes contrastes geográficos, étnicos, culturais e sociais. Nossos vários Brasis - em multiplicações incansáveis e impensáveis - que ainda aprendem a se conhecer e conviver. Mas que se reconhecem e se unem num gigantesco fio invisível que alterna ódios e amores, orgulhos e vergonhas, desalentos e esperanças. E esse fio, quando esticado até a sua tensão máxima, quase sempre, como mágica, enrosca-nos em novelos macios e aconchegantes e nos desfia, sem pudor, em surpreendentes e infindáveis sentimentos de emoções incontidas e alegrias incontroláveis! E é essa brasilidade aflorada - espontânea e contagiante - que sempre revela o nosso melhor!
E o nosso melhor mostrou-se ontem - muito menos para o mundo e muito mais para nós mesmos. Os nossos espelhos reluziram nossas imagens difusas e confusas, em identidades negadas, renegadas, contestadas e ressentidas. Resgatadas. Recompostas. Rendidas. E em altivez majestosa.
Majestade garantida pelo andar majestoso de Gisele na mais icônica passarela do mundo! Que me perdoem todas as demais passarelas e que me perdoem todas as demais rainhas. Mas depois da noite de ontem, só há uma passarela possível e só há uma rainha coroada. Maracanã e Gisele. Gisele no Maracanã.
Sem suntuosidade, mas com muita criatividade e originalidade , contamos quem somos e porque somos. Nossas misturas e nossas incoerências explicam-se na nossa história narrada sem romantismo, mas também sem condenação. Nossas composições, nossas apropriações e nossas dívidas estavam todas lá. Sem exageros e sem poupanças. E em extrema elegância.
Nossas expressões culturais tão variadas também tiveram o seu espaço justo e merecido. Entre tantas, destacou-se a nossa música, bálsamo pros ouvidos e pros corações. Tom, Chico, meu Chico, Caetano, Gil, Jorge Ben Jor, Elza Soares - diva!, Zeca Pagodinho, Marcelo D2, Ludmilla, Marcos Valle e , sim, Anitta. Porque somos todos esses ritmos. E somos todos esses ritmos com competência e excelência. Do Hino Nacional intimista combinando o samba e o clássico - uma das versões mais emocionantes de todas as versões! - às baterias ritmadas das escolas de samba , e até ao inesperado Gil/Caetano/Anitta.
E talvez "inesperação" seja a palavra que define a Rio 2016! De tudo o que se pudesse esperar, brilhou o inesperado! O que não faz sentido. O inexplicável. O inovador.
Inesperamos como palco para a diversidade. Para o encontro dos diferentes. Para a voz dos poucos ouvidos. Para a inclusão dos excluídos. Crianças com necessidades especiais, Lea T, delegação de refugiados.
Inesperamos com o símbolo da paz adaptado, com os anéis olímpicos absurdamente criativos, com a exuberância da natureza que precisa de tanto cuidado.
Inesperamos com a pira radiosa e com - pela primeira vez em toda a história das Olimpíadas - uma segunda pira "para o povo"!
Inesperamos com a descontração informal e transgressora! E tão apaixonada! E tão cativante!
Inesperamos com o calor, com o brilho, com as luzes, com as cores, com os sons, com as danças, com a grandiosidade luminosa que não coube dentro do Maracanã!
Inesperamos com o reconhecimento de que o verdadeiro atleta não é apenas o que acumula vitórias, mas sim o que pratica grandezas. Esse reconhecimento se fez presente nas merecidas homenagens aos atletas que escrevem a nossa história esportiva dentro desse valor. Salve Vanderlei!
Inesperamos porque realmente nos surpreendemos com a nossa capacidade realizadora! Nosso orgulho confinado escapou descontrolado e permitiu-se vibrar e sonhar!
Inesperamos porque nos vimos! E o que vimos foi o enorme potencial para revertermos a nossa precária condição e condenação.
No sol olímpico que acendeu a nossa chama, uma nova esperança arde recuperada e orgulhosa. E com a certeza de que somos mais, muito mais e maiores do que a pequeneza a que tentam nos reduzir. Pequeneza que, equivocadamente, assumimos como nossa. Mas que , definitivamente, não faz parte de nós.
De tantas imagens que, sei, serão inesquecíveis, escolho cinco. Cinco imagens que talvez apontem novos caminhos para nosso futuro mais justo, inclusivo, respeitoso e conciliador.
sexta-feira, 5 de agosto de 2016
Pirações.
O acendimento da pira é o ponto alto das cerimônias de abertura dos Jogos Olímpicos.
O aspecto solene desse ritual tem sua explicação na mitologia. A história da humanidade teve início quando o titã Prometeu roubou o fogo de Zeus e entregou-o para os mortais. O fogo ganhou, então, status de elemento sagrado. Em Olímpia, berço das Olimpíadas, uma tocha se mantinha acesa em honra a Zeus, no templo de Hera.
Na era moderna, a primeira pira foi acesa em Amsterdã 1928. A partir de Berlim 1936, instituiu-se o revezamento desde Olímpia até a cidade sede e, com isso, a tocha passou a viajar por terra, mar e ar.
Desde então, não há limites para as inovações! A cada edição, novos deslumbramentos que nos encantam e emocionam! Como dimensionar a honraria conferida aos atletas convidados para acender o símbolo maior do maior evento esportivo através dos tempos?
Os Jogos Olímpicos atravessam as décadas sem perder vigor, significado e reverência . Apesar de tantas guerras, disputas, distanciamentos, confrontos e estranhamentos, as Olimpíadas ainda conseguem provocar tréguas e uniões Acredito que só mesmo o poder divino desse fogo purificador possa explicar.
E hoje, enquanto nos preparamos para a cerimônia de abertura dos primeiros Jogos Olímpicos na América do Sul - E EM NOSSO PAÍS! - vamos relembrar as piras acesas ao longo dos tempos?
Que todas essas pirações nos inspirem! E que a nossa pira verde e amarela arda linda! Muito linda!
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Amsterdã 1928 |
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Los Angeles 1932 |
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Berlim 1936 |
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Londres 1948 |
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Helsinque 1952 |
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Melbourne 1956 |
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Roma 1960
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Cidade do México 1968 |
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Munque 1972 |
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Montreal 1976 |
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Moscou 1980 |
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Los Angeles 1984 |
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Seul 1988 |
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Barcelona 1992 |
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Atlanta 1996 |
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Sydney 2000
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