quinta-feira, 25 de novembro de 2021

Tanto a agradecer!

 



DANIEL E MARINA. Meu pai, minha mãe, meu irmão, minhas irmãs. Meus sobrinhos e minhas sobrinhas. Meus sobrinhos-netos e minhas sobrinhas-netas. Meus tios e tias. Meus primos e primas. Minhas famílias expandidas. Meu ex-marido e sua família. DANIEL E MARINA. Meus amigos e minhas amigas de infância desde Belo Horizonte e suas famílias. Meus amigos e minhas amigas de adolescência no CAp e suas famílias. Meus amigos e minhas amigas da Rua General Glicério e suas  famílias.  Minha família, meus amigos e minhas amigas de Sparta e suas famílias. Meus amigos e minhas amigas de USP e suas famílias. Meus amigos e amigas agregados ao longo da vida adulta e suas famílias. Meus amigos e minhas amigas agregados no trabalho e suas famílias.  Amiguitas y amiguitos y sus famílias. Minhas amigas de dança e suas famílias. DANIEL E MARINA. Meus alunos queridos e tão especiais e tão provocadores e que tanto me ensinam - e suas famílias. Todas as escolas, schools y escuelas  e todos os professores, teachers y maestros  que construíram a trajetória dos meus filhos. DANIEL E MARINA. Trovão, Cookie, Mel, Nina, Vito. DANIEL E MARINA. Todos os que fizeram/fazem a arte que me emociona. Todos os que escreveram/escrevem o que me transforma. Todos os teatros que me transportam. Todas as músicas que me embalam. DANIEL E MARINA.  Rio, Belo Horizonte, São Paulo, Buenos Aires, San Juan. Paris, Praga, New York, Barcelona. DANIEL E MARINA. E também e inclusive e não necessariamente nessa ordem, minha casa, minha janela, meu olhar pro mundo.  Pizza. Pastel de palmito. Novelas. Água sanitária. Tecnologia. Risoto. Rir. Rir muito. Gargalhar. Falar um monte de besteira. Ter com quem falar um monte de besteira. Pão de queijo. Rosas brancas. Rita Lobo. Sol e pôr do sol. Luas. Aspirador de pó robô. Havaianas. Figo na salada. Aliás, bolo de figo que ainda nem comi. Queijo branco. Siesta. Sorvete de coco. Maple syrup. Alexandre Nero. Mar. Sino da Igreja. E este ano, em especial, VACINA. E todos os cientistas e médicos e enfermeiros e profissionais que lutaram/lutam tão bravamente para  salvar nossas vidas. E por fim, mas não menos importante, aliás, muito pelo contrário, CHICO BUARQUE. E SEMPRE, ACIMA DE TUDO E DE TODOS E MAIS E MAIS: DANIEL E MARINA.


domingo, 26 de setembro de 2021

Deborah Colker e a "cura do que não tem cura"

 


O espetáculo "Cura", da coreógrafa Deborah Colker, é  de uma beleza absolutamente estonteante! E é, ao mesmo tempo, um soco no estômago e um enorme afago no coração!

Deborah Colker tem a inquietude dos grandes artistas! Como cria! Como inova! Como experimenta! E como mistura linguagens em harmonias imprevisíveis! Devo confessar que os seus trabalhos mais recentes me emocionam mais do que os trabalhos mais antigos. "Cão sem plumas", inspirada no poema homônimo de João Cabral de Melo Neto, é uma obra-prima! Só mesmo ela para dar movimento a uma dos meus poemas preferidos!

E agora chega "Cura"! O nome do espetáculo, ainda que não tenha sido inspirado em nada relativo à pandemia, estreia quando estamos desejosos e necessitados da cura literal, mas, principalmente, da metafórica. Estamos doentes de alma. E nunca a cura foi tão urgente.

Para lembrar, Deborah tem um neto, Theo, portador de epidermólise bolhosa, uma doença genética e hereditária rara que provoca a formação de bolhas na pele. A longa e frustrante jornada pela ciência  levou a coreógrafa a percorrer outros universos contraditórios entre si, mas que encontraram a convergência da resiliência. Não da desistência.

"Cura" é o resultado dessas referências e influências. Nos movimentos do corpo, a harmonia científica, história, mitológica, religiosa e musical. A riqueza simbólica é absurda! E nos chega em sons, alegorias e coreografias espetaculares!

O rabino Nilton Bonder responde pela dramaturgia. Quem leu "Alma Imoral" ou já assistiu a algumas palestras do Nilton Bonder entende a escolha. Quem já participou da celebração do Rosh Hashaná conduzido por ele na Pedra do Arpoador no Rio sabe o quanto ele une as pontas da vida e da fé. Fui uma vez, com o meu filho Daniel, por convite da minha amiga Beatriz Tremblais, e foi uma das experiências mais incríveis da minha vida!

Carlinhos Brown assina parte da  trilha sonora. A música de abertura coreografada por um só bailarino, fala justamente sobre a  dor. "Sou mais forte do que a minha dor". Nunca passei por uma dor tão dilacerante, mas tenho amigos que passaram e passam. E consigo entender a força desses versos. A força que não deixa a dor vencer, ainda que a dor se instale em cada cantinho do corpo ou da alma. Nos curativos da dor, a resistência. Que abertura forte, doída e penetrante! Sentimos a dor do bailarino. A dor se personifica no palco. 

Deborah, Bonder e Brown conseguem unir as emoções mais comuns e as mais raras! E fazem um espetáculo de uma grandeza que apenas todos os séculos da existência humana explicam!

A lenda do orixá Obaluê abre "Cura", declamada pelo próprio neto de Deborah, estabelece o lúdico que compõe também a busca pela cura do incurável. É uma abertura inesperada para um espetáculo de dança, mas não poderia haver nada mais apropriado! Na lenda do Orixá da doença e da cura, toda a trajetória do abandono, acolhimento, preconceito e superação. Não poderia haver analogias mais pertinentes!

A partir daí, estabelece-se uma sucessão de movimentos, contorções, distorções, músicas, tradições e palavras. É uma obra tão visual e sensitiva quando verbal. Mérito do Bonder, que escolheu a dedo as palavras certas e que nos incomodam tanto quanto acalantam. A potência das palavras... Já dizia Cecília Meirelles: "Ai, palavras, ai, palavras! Que estranha potência a vossa! Todo o sentido da vida principia a vossa porta:" De palavras isoladas a salmos lindíssimos, os caminhos da dor, da busca, da aceitação, do pedido de socorro, da ajuda, da insistência. 

Gostaria de destacar duas coreografias que particularmente me marcaram e que exemplificam os caminhos mencionados acima.  A primeira foi a simulação do Muro das Lamentações da tradição judaica.   Que impressionante! E a segunda foi a simulação do "caminhar". Caminhar sobre as águas, caminhar pelo íngreme, caminhar só, caminhar amparado, caminhar pesado, caminhar leve. 

O caminhar que, uma vez concluído, resulta na alegria que encerra o espetáculo. Porque a cura do que não tem cura, quando assimilada, pode - e deve! - conviver com a alegria! Essa é a grande lição.

Encerro com uma das referências mais  inspiradoras: HINENI. EIS-ME AQUI!


quarta-feira, 5 de maio de 2021

Carta para Paulo Gustavo.





São Paulo, 5 de maio de 2021.


Oi, Paulo Gustavo!

Ainda estou anestesiada com a sua partida tão prematura. Na verdade, estamos todos. O Brasil acordou numa baita ressaca hoje.

Sabe, Paulo Gustavo, desde a sua internação, imaginamos que a luta seria dura.  Conforme as notícias chegavam, entendemos que seria mais dura  ainda do que supúnhamos. E, por maior que fosse a nossa torcida pela sua recuperação, lá no fundo, no fundinho, sentíamos que seria uma luta perdida.

E olhe que teve torcida! Você não imagina! Quer dizer, sei que você imagina. Imagina, não. Sabe.  E com certeza sentiu! Você, certamente, sentiu toda essa onda de amor e cura que tomou conta de todo o Brasil! Que onda, Paulo Gustavo! Uma onda enorme, gigantesca! Uma onda tão tão tão mas tão colossal que banhou o nosso país dos sentimentos mais amorosos, espontâneos e generosos de que fomos capazes!

Paulo Gustavo, você conseguiu o improvável. Você conseguiu nos unir pela primeira vez em muitos e muitos anos! Porque, te juro, não conheço uma só pessoa que não rezasse por você, torcesse por você, sofresse por você. Por você, todas as divergências, por mais inconciliáveis em tempos tão extremos, deram uma trégua. Uma pausa nos ódios, nas agressões, nos muros. E todos, todos mesmo, conseguimos encontrar as emoções que nos lembram o que nos faz humanos. 

Faço uma pausa  porque queria simplificar e te chamar de Paulo. Paulo Gustavo é grande demais. Até pensei em adotar PG. Mas não dá. Você é Paulo Gustavo! Vou ter que seguir assim!

Perder você é perder muito mais do que pensamos possível. Individual e coletivamente. Porque te perder cria enormes feridas que aprenderemos a fechar em cicatrizes doídas. 

Vou começar a falar por mim, Paulo Gustavo. Acho que "te conheci" tardiamente. Mas natural, considerando a minha idade, né? E te conheci naquele comercial MARAVILHOSO do Open English, em que você disse uma das frases mais brilhantes "I give the white color in my mind"! Amo esse frase! Sou professora de Inglês, então já viu, né? Foi ai que pesquisei sobre você, aprendi quem você era e passei a ser fã. Fã mesmo! De carteirinha! D. Hermínia é inspiração. Tenho 2 filhos e me vejo, muitas vezes, encarnando a D.Hermínia! Tenho uma mãe de 94 anos que também tem muito da D.Hermínia. E quem não tem? Todas as mães se veem nela. Eu rio de chorar com ela! Como rio de chorar com outras personagens! Sabe qual é uma das minhas favoritas? Aquela que fuma feito uma chaminé! Sou ex-fumante e adoro aquela mulher!!! E Vai  que Cola? E a Vila? Durante a pandemia, corro pro Multishow quando acaba a novela da Globo pra ver as reprises. E a Vida em Marte??? Não tem cena melhor no cinema nacional do que vocês em NY esbarrando nos outros pra dizer "sooooryyyyy". Maravilhoso"!

Mas Paulo Gustavo, você é tão mais do que as suas personagens! Você é a leveza que  acalma. O seu humor é límpido, natural e fala diretamente com a gente. Esse humor espontâneo, cheio de furos, que ri de si mesmo, é o humor que nos conquistou. E sabe por quê? Porque você conseguiu juntar o palco e a plateia. No espaço dividido do teatro ou do cenário de TV, você derrubou os limites. Veio pra plateia e nos levou pro palco. Pouco, muito poucos conseguem isso. E, em você, parece tão natural e obvio! E foi nesse humor cúmplice e compartilhado que a gente aprendeu a te amar. 

Desde ontem às 21:12, não param de circular vídeos seus. E o coração aperta de um jeito que você nem imagina! Em um deles, o do Final de Ano na Globo, você diz que "Rir é um ato de resistência". É mesmo, Paulo Gustavo! Diante de tudo que temos vivido no nosso combalido país nos últimos anos, rir é resistir. Com todo o abandono, as escolhas contra a vida, as perdas irrecuperáveis, os lutos inconsoláveis, conseguir rir é resistência e sanidade. Não é fácil... Não tem sido fácil... Todos os dias somos confrontados com números assustadores... Com ações e omissões monstruosas... Nosso mundo é sombrio... Nossas vidas estão encolhidas,  recolhidas... Vivemos saudades... E um esforço quase impossível ver alguma graça além do caos...

A sua partida tirou quase toda a pouca graça que nos restava. Ficamos orfãos, Paulo Gustavo! Orfãos do profissional brilhante, do filho do qual nos apoderamos (desculpe, d. Déa!), do cara que defendeu tanta coisa, que quebrou tantos preconceitos, que provocou tantas mudanças, que abriu tantos corações fechados, que mostrou a careca e a cara lavada com  transparência cativante. Orfãos do amigo que te consideramos. Você é o conhecido de todos nós! Você é próximo, íntimo. A gente te conhece intimamente, Paulo Gustavo!  

Você virou o símbolo do nosso luto. Sua partida tão prematura e tão  injusta vai ser um divisor de águas nas irresponsabilidades  que têm nos condenado. Você vai ter orgulho de nos deixar mais esse legado. O preço é alto, altíssimo! Mas será pago.

Mas nem quero falar disso. Porque falar disso é trazer sentimentos muitos ruins de raiva, de muita raiva, de indignação, de revolta. E não quero isso pra nós hoje. Não merecemos isso. Muito menos você. 

Hoje é dia  apenas de sentimentos de luz. De amor. De gratidão. De admiração. De leveza. De tristeza profunda. Mas tristeza que constrói. De solidariedade desmedida à sua mãe, seu marido, seus filhinhos lindos... Abraço a sua mãe com todo o carinho de que sou capaz. Abraço o seu marido desejando a ele uma força que nem sei de onde ele vai tirar. Abraço os seus filhinhos certa de que eles saberão crescer lindamente  com a sua ausência sempre presente. 

Hoje é dia de serenar. E te desejar paz. 

Paulo Gustavo, que fique o riso. Escancarado. Resistente.

Como termino essa carta? Não sei...  Pode ser com I give the white color in my mind?  Acho que não tem melhor maneira de expressar o nosso vazio. Na mind e no heart. 

Com imenso carinho,

Maria Alice


segunda-feira, 15 de fevereiro de 2021

D.Algenir. A maior figurista dos carnavais!

 Passei a minha adolescência na Rua General Glicério, em Laranjeiras, certamente  uma das ruas mais lindas do Rio de Janeiro! Rua General Glicério, 440. Edifício Pajeú. Morávamos no 5º andar. Apartamento 502. No apartamento 503, morava a Cristina Sobral (também conhecida como Sobralina), neta ilustre do ilustre Sobral Pinto, de quem me apropriei também do tratamento íntimo "vovô Sobral". No apartamento 602, bem  em cima do nosso, morava a Graça Miranda (também conhecida como Graciosa). Formávamos um trio inseparável, e, para nossa sorte, continuamos trio até hoje. Juntas, tornamo-nos , assumidamente, gralhas, ou hienas, ou retardadas (até os filhos, muitas vezes, se referem a nós dessa forma!). A nossa capacidade de rir e falar besteira é inesgotável! 

Somos um trio singular. Eu e a Cristina sempre adoramos praia. A Graça não ia à praia. Eu e a Cristina adorávamos carnaval. A Graça não ia com a gente. Eu e a Cristina fumávamos escondido na escada. A Graça não fumava. Eu e a Cristina fuxicávamos tudo. A Graça pegava uma revista e lia. Eu e a Cristina brincamos, até hoje, de sermos repórteres culturais e esportivas. Simulamos transmissões ao vivo, inventamos entrevistas, conversamos com os nossos ouvintes! A Graça nos chama de loucas e se recusa a fazer parte da nossa equipe. Vocês precisavam escutar algumas das nossas transmissões "ao vivo". Põe qualquer live da Bethânia no chinelo!  

O que isso tudo tem a ver com figurinos de carnaval?  Tudo a ver! Porque a mãe da Graça, D. Algenir, essa linda da foto abaixo, era uma costureira de mão cheia! E eu e a Cristina tivemos a sorte de sermos presenteadas com os modelitos mais lindos do mundo!!! 

O melhor deles, e mais original, foi um pós-banho. Segundo a d.Algenir, era um substituto do roupão de banho (que a gente nem usava!) para sairmos do banho e ficarmos confortáveis até vestirmos a nossa roupa.  Era, na verdade, um tomara-que-caia curtinho, com um elástico na cintura. Os dois eram estampados e o meu era amarelo. Como a gente adorava aquele pós-banho!! Íamos pelo corredor uma pra casa da outra, sempre de pós-banho! Sentávamos pra fumar escondido na escada de pós-banho! Reuníamos para ouvir música de pós-banho! A gente não largava o pós-banho! Foi, sem dúvida, a peça de roupa que mais marcou a nossa adolescência! E não me conformo de não termos uma só foto para mostrar! 

Mas as melhores criações da D.Algenir foram as nossas fantasias de carnaval! Eu e a Cristina íamos, todos os anos, aos bailes da AABB e, aos domingos, quando acabava o baile, tentávamos entrar nas arquibancadas da Presidente Vargas para ver os últimos desfiles das Escolas de Samba. A Graça, claro, não ia com a gente. Mas d. Algenir garantia os nossos figurinos. E era assim, ano após ano, que desfilávamos os nossos pareôs super estilosos! Íamos de par de vasos! Mudava a estampa, mas o modelo era exatamente igual! E como a gente gostava! Como a gente se sentia mais linda do que qualquer fantasia em qualquer salão do Rio de Janeiro! Uma vez, num dos últimos carnavais a que fomos de clube, d.Algenir se esmerou! E fez uma baiana estilizada maravilhosa!!! A saia era bem curtinha, de renda branca. O bustier e o arranjo da cabeça eram de lamê dourado. Ficou MARAVILHOSA! 

Nesse carnaval tão atípico, recluso e confinado, as minhas memórias de carnaval jorram! E olho pra trás com uma enorme saudade... Mas, ao mesmo tempo, com uma alegria infinita por tantos e tantos carnavais aproveitados até o último acorde do "Cidade Maravilhosa"! 

E, mergulhada nessas memórias tão doces, tão foliãs, tão agradecidas, veio uma imensa saudade da d.Algenir... 

E me imaginei na escada entre o 5º e 6º andar do Edifício Pajeú... Vestida no meu pós-banho esperando a hora de colocar o meu pareô e cair na folia! E sei que a estrelinha lá no céu iria sorrir, orgulhosa das suas criações!

Salve, d. Algenir! Linda! Querida! Maravilhosa! 

 










Vocês não têm ideia! 

terça-feira, 26 de janeiro de 2021

Monica. Porque a primeira amiga da adolescência a gente nunca esquece.





Monica foi a minha primeira amiga quando voltei ao Rio com 10 anos de idade. Estudamos juntas na Escola Municipal Albert Schweitzer, na mesma rua em que morávamos. Quer dizer, na rua em que eu morava, Rua General Glicério, em Laranjeiras.  A Monica morava na rua de trás, Rua Professor Ortiz Monteiro, no icônico Edifício Três Mosqueteiros. Da área de serviço da minha casa eu conseguia ver a janela do quarto dela. E era assim que nos comunicávamos para combinar quem ia pra casa de quem. Porque sempre íamos uma pra casa da outra.

Estudamos juntas por apenas 1 ano. No Admissão, eu fui para o Colégio Teresiano, na Gávea. Não me lembro para onde a Monica foi... No ano seguinte, ambas tentamos o sorteio para entrar na 5ª série do Colégio de Aplicação da UFRJ (CAp) , na Lagoa. A Monica foi sorteada. Eu não. Continuei no Teresiano. Mas nossas janelas continuaram. E, como adendo dela, fui conhecendo os seus amigos e me entrosando no CAp.

Mônica repetiu a 5ª série. Eu entrei no CAp na 6ª série. E, ainda que tenhamos ficado em séries separadas,  nunca deixamos de estar juntas. Nunca. Herdei a sua turma original, da qual ela também jamais deixou de fazer parte.  E ampliamos nosso pequeno círculo com os novos alunos de sua nova turma. E nossas janelas continuaram.

Meu irmão nos levava para o Cap todas as manhãs. Minha irmã caçula, Andrea, e a irmãzinha da Monica, Rossana, também faziam parte da comitiva. E era a mãe da Monica que nos trazia de volta no final da manhã. Nossa convivência ultrapassou o universo de amigas. Virou família. Mesmo. Monica se tornou uma irmã. 

Minha adolescência foi ao lado dela. Não tínhamos segredos, tudo dividíamos. Usamos o primeiro soutien (eu antes que ela!) , menstruamos, demos o primeiro beijo. Juntas sonhamos, vibramos, descobrimos amores e todas as outras coisas importantes desta fase. Não me lembro de nada - importante ou não - que ela não tenha testemunhado ou participado. Eu mega metida, ela mega não metida. Eu na frente, ela na retaguarda. Uma encobrindo a outra. Inventamos roteiros fantásticos! Como tínhamos imaginação! Como ela tinha paciência com as minhas trapalhadas!  Ouvimos todas as trilhas sonoras de novelas ( a mãe dela SEMPRE comprava os discos das Trilhas Nacionais e Internacionais!)! Fizemos guerras de sapato contra a coitada da Rossana de deixar as marcas na parede do quarto! Fomos a festas! E nos metíamos em cada uma... E sempre, sempre, sempre, sempre, sempre defendíamos uma a outra. 

Monica era lobo em pele de cordeiro. Fala mansa... Quieta... Tímida... Mas por dentro... Quando o sangue fervia... Socorro!!! Por sorte, os seus ataques nunca foram dirigidos a mim! Não sei se sobreviveria! Monica tinha uma situação familiar conturbada e, volta e meia, "fugia de casa". Pra aonde? Pra minha casa! Perdi a conta de quantas vezes ela se refugiou conosco. Meus pais a acalmavam, a acolhiam, a mãe dela sabia que ela estava em segurança, ela ficava alguns dias, a poeira baixava, ela voltava pra casa. E essa rotina se repetiu inúmeras vezes. Eu adorava a mãe dela! Mais jovem, tinha uma cabeça mais aberta, a gente conversava muito! E meus pais adoravam a Monica! Virou filha mesmo! Uma vez, ela disse que, se um dia se casasse, queria que o meu pai entrasse com ela na igreja. Isso não aconteceu, porque meu pai morreu muito cedo. Nem sei se realmente aconteceria, mas era essa a nossa intimidade.

Vivemos nossas vidas adultas muito separadas depois que vim pra SP. Monica não teve uma vida fácil. Teve a Gabi sozinha, ficou viúva muito cedo e com outros dois filhos: Marcelo e Roberta. Bateu um pouco a cabeça, mas a sua capacidade de resistência e recomeços é impressionante! Tenho uma admiração infinita pela coragem, pela determinação, pelo despojamento! Hoje ela mora em Portugal. Um novo recomeço, que, espero, lhe traga tudo que ela sempre desejou, correu atrás e merece!

Hoje é o dia dela! 63 anos! E o que eu desejo não cabe nesse número tão pequeno pra contar a nossa história. 

Hoje é o dia dela! E eu só quero agradecer! Muito! Sempre! Porque se eu, ao longo da minha vida, aprendi a ser uma boa amiga, foi com ela que aprendi! Ela me ensinou a amizade da forma mais destilada, generosa e comprometida possível! 

Monica, minha irmã de alma e de vida: PARABÉNS!!!!!!! Te amo tudo o que posso!!!!





quinta-feira, 14 de janeiro de 2021

63.




Hoje acordei com 63 anos completos. 

Quem me conhece sabe que nunca tive problemas com a idade. Passei dos 20 aos 30, dos 30 aos 40, dos 40 aos 50 e dos 50 aos 60 sem traumas. Com alguns sustos, claro. Mas sem traumas. Cada década é um pequeno susto. Não pelo o que ficou pra trás, mas pelo o que vem pela frente. Sempre acreditei que, se vivemos plenamente nossos tempos, o que fica pra trás é ganho. E não nostalgia. Nostalgia é um vazio incômodo pelo o que deixamos de viver. Nostalgia é diferente dos rompantes de saudades que sentimos. E que são bons de sentir. E que não nos deixam esquecer a nossa história.

Ter trinta anos foi o susto pelas responsabilidades do casamento e da maternidade. Ter quarenta anos foi o susto pela dosagem entre ser eu e ser as outras que eu tinha que ser. Ter cinquenta anos foi o susto de me resgatar fora do casamento e com os filhos independentes. E ter sessenta anos está sendo  escolher, dentro do possível, com o que, como  e com quem (con)viver. Inclusive a escolha pelos meus cabelos naturalmente brancos (aí, o susto foi dos outros! Não meu!)!

Os sessenta anos me têm sido relativamente leves. Prazeirosos. Cheios de humor. Plenos em novos aprendizados. Transbordantes de alegrias e orgulho de ver os meus filhotes trilhando os seus caminhos. Rodeados de jovens que me enchem de energia e compensação todos os dias. 

Mas mesmo com essa aparente serenidade e aceitação do tempo que passa, jamais, em tempo algum, imaginei completar 63 anos em meio a tamanho caos social, político e humano... Mas escolho não falar, aqui e agora, sobre o caos . Escolho  falar, aqui e agora, sobre as flores que brotam/têm brotado do caos.

Escolho falar da minha mãe, que aos 94 anos, tem (sobre)vivido bem, saudável, cuidada, amada! 

Escolho falar dos meus irmãos que, em enorme parceria e cumplicidade, nos alternamos para dividirmos nossas preocupações e dificuldades!

Escolho falar dos meus sobrinhos que nos mantêm desafiados e antenados! 

Escolho falar dos meus primos, de um e do outro lado, que têm sido um enorme alento e porto seguro!

Escolho falar dos amigos/amigas maravilhosos que tenho a sorte de ter. Amigos de longe, de perto, de antes, de durante, antigos, novos, cultivados, resgatados, adotados, descobertos, "reais", virtuais. Amigos que escutam. Ou que falam. E que falam outras línguas. Ou que riem junto comigo até a barriga doer. Ou que choram junto. Que ligam sistematicamente pra saber como estou. Que acompanham os programas bizarros aos quais assisto. Que leem os mesmos livros. Que mandam aqueles textos enormes que nem abro. Que discutem e criam polêmicas. Que mandam os links que você, sim, abre, lê e gosta. Que mandam fotos lindas. Que bordam, costuram, cozinham. E me inundam de fotos que começam a congestionar a memória do meu celular. Que me irritam de um jeito que nem sei dizer. E que me surpreendem de outro jeito que também não sei dizer.

Escolho falar dos artistas que são o único ar que nos fazem respirar e nos manter vivos. Artistas vivos  e os eternos. Os das pinturas, os das músicas, os das palavras, os das telas, os das belezas que até machucam e fazem chorar. E que me fizeram companhia todos os dias desse último ano. 

E, por fim, escolho falar dos meus filhotes. Do meu filho que, mesmo longe, me obriga a sair da minha zona de conforto. Que me dá ordens de "já sabe, né, mãe, de máscara, longe, não inventa!" Ou "Não tenho estrutura pra ver você ou o papai em risco". e que, às vezes, "Tá sem saco pra falar." E que, cada vez que me aparece na tela do meu computador, faz o meu coração transbordar. Ele é tão lindo! Ele é tão "gente"! E eu estou com tanta saudade de abraçar e beijar...

E da minha filhota linda. Meu facetime de todas as noites. Quietinha, faz a sua vida. E, às vezes, me joga  bombas. Joga, não. Comunica. E eu, quietinha, engulo. Não dá pra contrariar. E que me empresta a Nina. E que se preocupa. E faz minhas compras online. E organiza o que tem que organizar. E finge, e eu quase acredito, que está interessada nas minhas novidades. E vem me visitar na garagem. e eu estou com tanta saudade de abraçar e beijar...

E foi assim, então, que completei 63 anos. 

Completei 63 anos com o meu rosto coberto.



Completei 63 anos cantando parabéns ao lado da minha mãe.  




Completei 63 anos recebendo carinhos de todos os lados. Mensagens e chamadas que foram recebidas como beijos e abraços. Necessários e apreciados.

Completei 63 anos tão longe e tão perto. Em tempo e espaços reaprendidos. Adaptados e valorizados.

Completei 63 anos com esse mimo da minha filhota e do genro, entregue em drive thru na garagem: flores lindas, um jantar especial (massa recheada de cebola caramelizada com molho bechamel e até  queijo ralado!), e cupcakes, com velinhas e tudo pra eu cantar parabéns pra mim! O jantar de aniversário mais especial que tive em 63 anos! 





E foi assim, então que completei 63 anos...




sexta-feira, 1 de janeiro de 2021

2021: sobre décadas e dandelions.

 


Dandelion é a nossa flor Dente-de-leão. Uso o nome em Inglês, porque gosto mais  do som. Acho que tem mais som de flor, tem mais cheiro de flor. Além disso, o meu poeta preferido, Walt Whitman, escreveu um lindo poema  chamado "The First Dandelion", e então eu adotei de vez o nome, em estrangeirismo assumido.

São muitas as lendas em torno dessa flor. Dizem, por exemplo, que dandelions são casas de fadas. Com a chegada do homem ao mundo, todas as criaturas mágicas tiverem que se esconder.  Os vestidos volumosos das fadas dificultaram  os seus esconderijos e elas, então, se transformaram nas belas dandelions. Dizem  também que a cor amarela tão intensa é poeira produzida pela carruagem do Sol. Acreditava-se, como outro exemplo,  que esfregar a flor sobre a pele atraía irresistível bem-querer e até as bruxas usavam essa tática para serem aceitas pelas pessoas. Até mesmo a mitologia atribui poderes para essa flor. Segundo a lenda, Teseu teria se alimentado  apenas de dandelions por 30 dias seguidos para adquirir a força necessária para derrotar o Minotauro. No Nordeste do Brasil, dandelions são conhecidos como "Esperança" e há um dito popular que se refere à flor: "Abre as janelas e deixa a esperança entrar na tua casa trazida pelo vento da tarde." Não é lindo? 

Dandelions resistem ao inverno e renascem a cada primavera em florações em tom amarelo vivo. Após florir, formam um papilho de sementes claras que mais parecem plumas. E essas plumas espalham-se facilmente ao menor sopro. Ou pela brisa mais suave. 

Quem, em criança, não adorava colher essas flores que se espalha por todo o lado e as soprava  mentalizando desejos secretos? Uma das mais doces memórias da minha infância em Belo Horizonte era desejar algum desejo bem intensamente e soprar as flores para ver para onde eram levadas... Ou apenas soprar, sem desejos, apenas por soprar.  

Pensando na década que se encerrou no  dia 31 de dezembro de 2020, e  na nova década que se inicia hoje, pensei em toda a simbologia dessa flor. 

A década passada foi cruel. Para nós, brasileiros, foram dez anos de grandes desafios políticos e econômicos. E um enorme retrocesso nos valores humanos... Para o mundo, a pandemia do novo coronavírus selou a década num rastro de mortes, perdas, incertezas e atos de extremas desumanidades. 

Na nova década, teremos que enfrentar esse terrível legado. Teremos que rever conceitos, valores, práticas. Teremos que refazer planos, ajustar expectativas. Teremos que recuar algumas casas para avançar na direção que queremos e devemos. E, para isso, precisaremos de força, otimismo e  muita esperança.

E é aí que dandelions me emprestam a sua poesia. É da imagem da força dessa flor que brota, perene, desafiando o improvável, que resistiremos. É  do otimismo de sempre acreditar na fecundidade dos solos, ou aventurar-se pelo desconhecido, que insistiremos. 

Mas é sobretudo da esperança obstinada e incansável, que venceremos. Sopremos! Sopremos dandelions! Imitemos a sua capacidade de serem levadas pelo ventos. Sigamos, em frente, a favor do vento. Sopremos! Sopremos dandelions! E, a cada sopro, um desejo profundo de cura. Curas físicas. Curas emocionais. Curas individuais. Curas coletivas. 

Que a nova década seja  um imenso jardim de dandelions! E que elas brotem, vigorosas, rompendo o inverno árido e estéril que acabamos de deixar pra trás. Hoje é o primeiro dia! A primeira dandelion! 

Como inspiração, segue o lindo poema do Walt Whitman, seguido da tradução. Como eu gosto desse poeta! 

The First Dandelion (Walt Whitman)

"Simple and fresh and fair from winter's close emerging,

As if no artifice of fashion, business, politics, had ever been,

Forth from its sunny nook of shelter'd grass-innocent, golden calm as the dawn,

The spring's first dandelion shows its trustful face."


"Singelo, fresco e belo quando brota no fim do inverno,

Como se nenhum artifício da moda, negócios, política tivesse um dia existido,

Surge do seu soalheiro recanto a erva abrigada - inocente dourado, sereno como a aurora,

o primeiro dente-de-leão primaveril que mostra o seu rosto confiante."