terça-feira, 19 de junho de 2018

Chico. 74 anos. Eternamente...











"Esta canção não é mais que mais uma canção... Quem dera fosse uma declaração de amor..." (Yolanda - Chico Buarque)

Chico Buarque completa hoje 74 anos de idade!!!

 Dos seus 54 anos anos de carreira, acompanho, ativa e apaixonadamente, 52. Chico é, desde a infância, a minha referência absoluta!

Com Chico aprendo música, letra e a voz inconfundível. Aprendo política e o olhar de mundo crítico e preciso. Aprendo o amor em todas as suas formas de amar. Aprendo a poesia, a prosa e a dramaturgia. Tem artista mais completo? Ou tão máximo em tudo?

Chico tem me proporcionado as melhores memórias culturais. Não perdia Pra Ver a Banda Passar, seu programa na TV com Nara Leão. Tive o privilégio de participar dos shows no Teatro Opinião (quantos autógrafos! Sim, quem ia comigo sabia que depois tinha que correr atrás de autógrafos!), shows memoráveis no Canecão (incluindo o inesquecível show com a Maria Bethânia), alguns raríssimos no João Caetano e o show arrebatador  com Pablo Milanes (foi ali que tomei-me caudalosamente de Yolanda! Anseio por uma neta com esse nome!), além dos mais recentes. Vi Gota d'Água om Bibi Ferreira, Os Saltimbancos na montagem original e a Ópera do Malandro (pelo menos 5 vezes!) com Marieta Severo e Elba Ramalho. Li Fazenda Modelo, Chapeuzinho Amarelo, Estorvo, Benjamim, Budapeste, Leite Derramado e o Irmão Alemão. Assisti Quando o Carnaval Chegar, Certas Palavras e Chico - Artista Brasileiro. Tenho alguns livros de coletâneas e resenhas, além de 12 dvds sobre a sua obra. E devo ter quase todos os LPs e Cds. (incluindo um maravilhoso de duetos geniais!) Desses, tenho carinho especial pelos três primeiros, que ganhei omo presente no meu aniversário de 10 anos.

Comemorei os meus 40 anos num show dele no Canecão. No meio de um daqueles silêncios entre uma música e outra, ouviu-se uma voz bem alta na plateia: INSUBSTITUÍVEL!!! Foi uma gargalhada geral! Dele, inclusive! Mas, no íntimo, era o que todos pensávamos. Para mim, pelo menos, é e sempre será! Chico. O meu Chico. Sempre. Desde sempre. Para sempre. Insubstituível.

Com ele vivencio a indescritível relação de fã. Fã  vem do latim "fanaticus", com significado original "aquele que se diz inspirado pelos deuses" e, posteriormente, "aquele que tem admiração excessiva por alguém". Desse último sentido, o inglês adotou "fanatic" e o diminutivo "fan". E assim, emprestamos do inglês a nossa adaptação para fã. Particularmente, prefiro o significado original. Ser inspirado pelos deuses remete à manifestação artística e criativa na sua essência mais cristalina e pura. Como o Chico. Inspirado e inspirador. Valter Hugo Mãe, um dos meus escritores  preferidos da atualidade, já disse que "o Chico Buarque está perto do super-humano. É alguém que está um pouco para lá do que é expectável do simples humano. Caetano Veloso, no aniversário de 70 anos do Chico, escreveu: "Chico está em tudo. Tudo está na dicção límpida de Chico."

Ser fã do Chico tem sido me reconhecer na sua obra. Ecoar nos seus pensamentos. Encantar-me com o seu poder quase mágico de combinar palavras incombináveis. Surpreender-me com poesias onde poesia não cabe. Decifrar o mundo na beleza até onde ela falta. Fazer o cotidiano especial. E desafiar tantas e tantas expressões e linguagens.

E por todos esses momentos, essas memórias, essas emoções, esses diálogos com a sua obra, essas letras, essas músicas, esses livros, essas peças, essa voz, essa presença e, claro, esses olhos de luz, celebro a data e as  inspirações!

Viva Chico!!!



sexta-feira, 1 de junho de 2018

Quero Morrer Com Meu Próprio Veneno.






"Não pode ter sido de outro modo, que o ponto principal é o seguinte: se eu me afogar voluntariamente, pratico um ato; um ato é composto de três partes: agir, fazer e realizar. Logo afogou-se porque quis. " (Shakespeare - Hamlet - Ato V -Cena 1)


As mulheres de Shakespeare são complexas, multifacetadas  e,  por vozes emprestadas, transcenderam os limites de sua condição de submissão dentro de uma estrutura patriarcal extremamente estratificada.


A doce Julieta (Romeu e Julieta), a obediente Desdêmona (Otelo), a casta Miranda (A Tempestade), a independente Catarina (A Megera Domada), a poderosa Cleópatra (Antonio e Cleópatra) e a ambiciosa Lady Macbeth são algumas das heroínas que ainda permitem leituras contemporâneas do papel social da mulher.


Mas nenhuma outra personagem de Shakespeare tem sido mais inspiradora do que a frágil Ofélia de Hamlet!  A  bela jovem que foge de sua loucura entregando-se ao sono plácido rodeada  por flores no berço de águas foi/tem sido musa inesgotável  na pintura, poesia, cinema, moda, ensaios fotográficos - e teatro.

Ophelia (1852) de Sir John Everett Millais.



Elena , filme de Petra Costa.


A jovem Ana Carolina, integrante do Núcleo de Dramaturgia SESI - British Council que há 10 anos estimula a escrita como processo de renovação, apresenta um texto estimulante que multiplica Ofélia em 3 para negar a sua história determinada pelo universo masculino.


A diretora Mika Lins  - e seu mega competente assistente de direção Daniel Mazzarolo, não por acaso, meu filho - levam ao palco essa verdadeira revolução Ofeliana! Que resultado incrível!




Luisa Micheletti é o presente, a visão sobre si mesma. Luiza Curvo é o pensamento, a interpretação  sobre a realidade dos acontecimentos e Luna Matinelli é os olhares dos outros, pelo seu ponto de vista.Uma Ofélia que fala, uma Ofélia que pensa e uma Ofélia que escuta. É na interação e alternância  entre as 3 Ofélias que refletimos sobre resistir ou sucumbir num mundo ainda hostil a Ofélias.

Mika nos presenteia com um trabalho lindíssimo, sensível, poético e muito alegórico.

A unidade e independência das 3 atrizes é impressionante!Que sintonia em palco! Que expressividade dramática! Que belíssimo trabalho corporal!





Gosto muito dos cenários e figurinos da Mika, quase sempre minimalistas, mas muito  eficientes! Desta vez, o palco  é, na verdade, um corredor ocupado por  vários vestidos de tule preto pendurados como fantasmas. O efeito é lindíssimo! As Ofélias igualmente se vestem de preto com transparências em tule.



A potência do cenário e figurinos é complementada pela  iluminação nada sutil que corre e corta o corredor e as personagens em feixes luminosos de cores fortes. As sequências do verde e do vermelho impressionam pela  beleza e dramaticidade.




A maior qualidade da montagem é libertar-se do enredo de Hamlet. A  referência necessária - mas apenas a necessária -  é, acertadamente, por gravação em off.  Desta forma, o protagonismo é, definitivamente, retirado das mãos de Hamlet, Polônio e Laertes -  respectivamente o noivo, o pai e o irmão -  para ser,   finalmente,  conquistado por Ofélia  para a escolha de seu próprio destino.

A composição da(s) Ofélia(s) contemporânea(s) trazem mais uma voz  - em altíssimo tom - para as questões cada vez  mais urgentes sobre a sociedade ainda pautada pelo homem. E que precisam conceder a liberdade para que cada Ofélia morra com  seu próprio veneno!