quarta-feira, 5 de maio de 2021

Carta para Paulo Gustavo.





São Paulo, 5 de maio de 2021.


Oi, Paulo Gustavo!

Ainda estou anestesiada com a sua partida tão prematura. Na verdade, estamos todos. O Brasil acordou numa baita ressaca hoje.

Sabe, Paulo Gustavo, desde a sua internação, imaginamos que a luta seria dura.  Conforme as notícias chegavam, entendemos que seria mais dura  ainda do que supúnhamos. E, por maior que fosse a nossa torcida pela sua recuperação, lá no fundo, no fundinho, sentíamos que seria uma luta perdida.

E olhe que teve torcida! Você não imagina! Quer dizer, sei que você imagina. Imagina, não. Sabe.  E com certeza sentiu! Você, certamente, sentiu toda essa onda de amor e cura que tomou conta de todo o Brasil! Que onda, Paulo Gustavo! Uma onda enorme, gigantesca! Uma onda tão tão tão mas tão colossal que banhou o nosso país dos sentimentos mais amorosos, espontâneos e generosos de que fomos capazes!

Paulo Gustavo, você conseguiu o improvável. Você conseguiu nos unir pela primeira vez em muitos e muitos anos! Porque, te juro, não conheço uma só pessoa que não rezasse por você, torcesse por você, sofresse por você. Por você, todas as divergências, por mais inconciliáveis em tempos tão extremos, deram uma trégua. Uma pausa nos ódios, nas agressões, nos muros. E todos, todos mesmo, conseguimos encontrar as emoções que nos lembram o que nos faz humanos. 

Faço uma pausa  porque queria simplificar e te chamar de Paulo. Paulo Gustavo é grande demais. Até pensei em adotar PG. Mas não dá. Você é Paulo Gustavo! Vou ter que seguir assim!

Perder você é perder muito mais do que pensamos possível. Individual e coletivamente. Porque te perder cria enormes feridas que aprenderemos a fechar em cicatrizes doídas. 

Vou começar a falar por mim, Paulo Gustavo. Acho que "te conheci" tardiamente. Mas natural, considerando a minha idade, né? E te conheci naquele comercial MARAVILHOSO do Open English, em que você disse uma das frases mais brilhantes "I give the white color in my mind"! Amo esse frase! Sou professora de Inglês, então já viu, né? Foi ai que pesquisei sobre você, aprendi quem você era e passei a ser fã. Fã mesmo! De carteirinha! D. Hermínia é inspiração. Tenho 2 filhos e me vejo, muitas vezes, encarnando a D.Hermínia! Tenho uma mãe de 94 anos que também tem muito da D.Hermínia. E quem não tem? Todas as mães se veem nela. Eu rio de chorar com ela! Como rio de chorar com outras personagens! Sabe qual é uma das minhas favoritas? Aquela que fuma feito uma chaminé! Sou ex-fumante e adoro aquela mulher!!! E Vai  que Cola? E a Vila? Durante a pandemia, corro pro Multishow quando acaba a novela da Globo pra ver as reprises. E a Vida em Marte??? Não tem cena melhor no cinema nacional do que vocês em NY esbarrando nos outros pra dizer "sooooryyyyy". Maravilhoso"!

Mas Paulo Gustavo, você é tão mais do que as suas personagens! Você é a leveza que  acalma. O seu humor é límpido, natural e fala diretamente com a gente. Esse humor espontâneo, cheio de furos, que ri de si mesmo, é o humor que nos conquistou. E sabe por quê? Porque você conseguiu juntar o palco e a plateia. No espaço dividido do teatro ou do cenário de TV, você derrubou os limites. Veio pra plateia e nos levou pro palco. Pouco, muito poucos conseguem isso. E, em você, parece tão natural e obvio! E foi nesse humor cúmplice e compartilhado que a gente aprendeu a te amar. 

Desde ontem às 21:12, não param de circular vídeos seus. E o coração aperta de um jeito que você nem imagina! Em um deles, o do Final de Ano na Globo, você diz que "Rir é um ato de resistência". É mesmo, Paulo Gustavo! Diante de tudo que temos vivido no nosso combalido país nos últimos anos, rir é resistir. Com todo o abandono, as escolhas contra a vida, as perdas irrecuperáveis, os lutos inconsoláveis, conseguir rir é resistência e sanidade. Não é fácil... Não tem sido fácil... Todos os dias somos confrontados com números assustadores... Com ações e omissões monstruosas... Nosso mundo é sombrio... Nossas vidas estão encolhidas,  recolhidas... Vivemos saudades... E um esforço quase impossível ver alguma graça além do caos...

A sua partida tirou quase toda a pouca graça que nos restava. Ficamos orfãos, Paulo Gustavo! Orfãos do profissional brilhante, do filho do qual nos apoderamos (desculpe, d. Déa!), do cara que defendeu tanta coisa, que quebrou tantos preconceitos, que provocou tantas mudanças, que abriu tantos corações fechados, que mostrou a careca e a cara lavada com  transparência cativante. Orfãos do amigo que te consideramos. Você é o conhecido de todos nós! Você é próximo, íntimo. A gente te conhece intimamente, Paulo Gustavo!  

Você virou o símbolo do nosso luto. Sua partida tão prematura e tão  injusta vai ser um divisor de águas nas irresponsabilidades  que têm nos condenado. Você vai ter orgulho de nos deixar mais esse legado. O preço é alto, altíssimo! Mas será pago.

Mas nem quero falar disso. Porque falar disso é trazer sentimentos muitos ruins de raiva, de muita raiva, de indignação, de revolta. E não quero isso pra nós hoje. Não merecemos isso. Muito menos você. 

Hoje é dia  apenas de sentimentos de luz. De amor. De gratidão. De admiração. De leveza. De tristeza profunda. Mas tristeza que constrói. De solidariedade desmedida à sua mãe, seu marido, seus filhinhos lindos... Abraço a sua mãe com todo o carinho de que sou capaz. Abraço o seu marido desejando a ele uma força que nem sei de onde ele vai tirar. Abraço os seus filhinhos certa de que eles saberão crescer lindamente  com a sua ausência sempre presente. 

Hoje é dia de serenar. E te desejar paz. 

Paulo Gustavo, que fique o riso. Escancarado. Resistente.

Como termino essa carta? Não sei...  Pode ser com I give the white color in my mind?  Acho que não tem melhor maneira de expressar o nosso vazio. Na mind e no heart. 

Com imenso carinho,

Maria Alice