quarta-feira, 9 de novembro de 2016

Trump e muros.


Em 9 de novembro de 1989 Daniel tinha 2 anos e 4 meses e Marina quase 10 meses. E eu testemunhava, incrédula, as imagens do Muro de Berlim sendo derrubado por marretas e picaretas. Marretas e picaretas mais simbólicas do que reais e que mal tiraram lascas da solidez separatista que o tinha erguido 28 anos antes. A imagem daqueles milhares de pessoas ocupando o topo do muro me impactam até hoje. Para a minha geração, juntamente com a chegada do homem à lua, uma das maiores transformações da humanidade.

Em 2012 fui a Berlim com a Marina e emocionei-me muito diante do que restou do muro. Por tudo o que representou antes e depois da sua queda. Foram minutos de recolhimento e absorção solitários e necessários. Os grafites desordenados e de cores e imagens intensas - a maioria de teor pessimista e fatalista - carregam um simbolismo que minha filha, de outra geração, não sentiu.

Ao longo desses 27 anos,  a queda do muro tem nos assombrado com sua herança contraditória.  É  bem verdade que algumas liberdades incontestáveis ganharam espaço e o mundo desordenou-se em pontes importantes. No entanto, muitos outros muros -  visíveis e invisíveis -  foram sendo erguidos diariamente, impondo distâncias absolutas e intransponíveis. Os muros das inconciliações e intolerâncias alastram-se em proporção ainda maior do que as  pontes de conexão disponibilizadas  pelo nosso  mundo globalizado.

Hoje, num mesmo coincidente 9 de novembro, a eleição de Donald Trump re-ergue  o que talvez  seja o  muro mais simbólico da história da humanidade. O país guardião da democracia sucumbe ao autoritarismo separatista, discriminatório, preconceituoso, machista e xenofóbico. Em nome do resgate da grandeza épica -  ainda mais potente do que o Sebastianismo português - retira-se do mundo escolhendo que valores guardar e que valores rejeitar, além de escolher quem comporá a identidade idealizada e renegar, a qualquer preço, quem  ameaça a sua pureza.

A promessa do muro divisório com o México é apenas um dos muros que a partir de hoje passam a delinear  a geografia estadunidense. A proximidade com ideologias nacionalistas até então opositoras assusta. Não se imaginaria, em qualquer tempo, sob qualquer condição ou configuração, um discurso de um presidente americano alinhado com líderes antidemocráticos.

Temeroso perceber recuos tão determinantes quanto mais o mundo se mostra frágil e desamparado. Desalentador reconhecer que os movimentos para entendimento e conciliação serão paralisados. Incerto prever os desdobramentos e impactos no equilíbrio entre ordens e desordens no mundo. Essas ordenações e desordenações são mutáveis e são elas que promovem as transformações. Progressos e retrocessos igualmente.

MAKE AMERICA GREAT AGAIN. Pergunto-me em que grandeza os americanos votaram.







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