quinta-feira, 22 de setembro de 2016

Pra não dizer que não falei de flores.

Era um abismo inconformado com o seu triste destino. Desde a sua primeira consciência, nada mais lhe chegava que não sombras, infortúnios e limites de desesperança. Não gostava dos gemidos e soluços que ecoavam ensurdecedores por suas profundezas. Repudiava o espaço sombrio do seu confinamento. Sonhava alto, luminoso e amplo. Um dia, por descuido, uma flor caiu aos seus pés. Uma flor! Ele já tinha visto uma flor antes. Mas morta, despedaçada. Assim inteira, colorida e perfumada era a primeira vez! Que felicidade! O abismo olhou em volta. Olhou, olhou até que viu um pedacinho escondido de terra. Que sorte! Cavou um canteirinho e plantou a flor. O abismo não cabia em si de tanta alegria! Que flor linda! Seria o abismo mais colorido do mundo! E o tempo passou. E o abismo cuidou e cuidou daquela flor. E a flor cresceu. E floresceu muitas e muitas vezes. E logo o abismo estava mais florido do que o jardim mais florido do mundo! E quem chegava ali, na pontinha daquele limbo, sentia apenas cores e perfumes. E o abismo não parecia mais tão assustador...





(Publicado no grupo MINICONTOS em 24.07.2016. Palavra-chave: ABISMO)

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