terça-feira, 27 de março de 2018

Circo.





Aquele era o seu mundo. Não conhecia qualquer outro. Por quantas cidades passavam, pra ela dava no mesmo. Não arriscava nem uma olhadinha pra fora. Mas dentro, ah...Só ali dentro era ela. Conhecia cada palmo do picadeiro, cada luzinha da ribalta, cada remendo da lona. E após cada espetáculo, com a vassoura na mão, limpava as terras de chãos após chãos e ousava ser além dela mesma. Varria. E tornava-se corajosa como o domador, engraçada como o palhaço e graciosa como a trapezista. Varria. Imaginava-se nas roupas coloridas e repetia cada fala e cada gesto que sabia como ninguém. Varria. E ouvia as crianças gargalharem e o público aplaudir de pé. Era a estrela. E varria. E esquecia que nem tinha nome, nem idade, nem passado. Tinha apenas as roupas velhas doadas aqui e ali. E um colchão no chão perto da jaula de elefante. E uma caneca e prato só dela, com uma rosa entalhada que um antigo malabarista tinha feito especialmente pra ela. E tinha a vassoura na mão todas as noites. E as terras de chãos que ela varria junto com o futuro que ela nem sonhava que existia.

(Publicado no Grupo Minicontos em 25.05.2014. Palavra-chave: PALHAÇO)

Um comentário:

  1. Triste historia. No se si ese caso existe o no. Pero estan las otras que son secuestradas por proxenetas. Que las encierran en una habitacion y no la dejan salir. Para darle sexo a los clientes. Y del circo los pobres animales que estan encerrados en jaulas. Privados de todo. Con calor, con frio. Solo para que unos se diviertan.
    Saludos

    ResponderExcluir